sexta-feira, 5 de março de 2010

Accent

Mal uma aspirante a modelo desembarca em São Paulo e já está reproduzindo a fala pós-patricinha abonada que se tornou dominante em parte da cidade, com vogais estendidas, pronúncia veloz e 'erres' pronunciados. Ex: "Ah saaaaabe, nem sei se eu queeeero ir". Para quem não conseguiu identificar, Gisele Bündchen fala escancaradamente dessa forma - quem não souber que ela é gaúcha do interior, não tem como adivinhar. É interessante. Esse sotaque - que se restringe ao sexo feminino jovem (os meninos têm preferido imitar o jeito de falar dos 'manos', bem fake por sinal) - é recente (entre outras falas novas), simplesmente não existia até o começo dos anos 1990. Coincide com a própria afirmação de São Paulo como cidade dominante e polo cultural do país, deixando de ser o eterno patinho feio e caipira em comparação com o Rio, cujo declínio se acentuou não por coincidência a partir dessa mesma época (mas que felizmente está sendo revertido pouco a pouco). Isso tem se refletido na televisão, já que de uns tempos pra cá, atores que falam com sotaque de São Paulo - qualquer um - continuam com ele, sem se deixar 'contaminar' pelo belo sotaque carioca - até bem pouco tempo isso não acontecia, é só lembrar Luana Piovani, paulista de São Bernardo do Campo que virou carioca da gema já na segunda fala de alguma novela ou minissérie. Angélica (Santo André) idem - Glória Menezes, Fernanda Montenegro e Tony Ramos são exceções. Mas o que me fez escrever este post é uma outra coisa. Nem todas as meninas que vem de fora se sentem à vontade para falar daquela forma. Noto que as que chegam para trabalhar em profissões mais humildes geralmente continuam a se expressar em seus sotaques de origem, Brasil a fora. E é evidente que não se trata de falta de habilidade para reproduzi-lo, ou ausência de contato com outras jovens que o praticam. Arrisco dizer que elas não cogitam falar 'patricinha' porque não se sentem no direito - por não possuir o status social que se exige para se comunicar naquele código. Mas, por linhas tortas - já que os motivos não se justificam - acho bom que assim seja, porque o sotaque patty me soa mal, não só pela sonoridade discutível, mas porque entrega uma postura deliberadamente fútil e meio ignorante.

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