sábado, 16 de janeiro de 2010

Bridges

O grande escritor John Coetzee - que além de xará, nasceu no mesmo ano de John Lennon (1940) - nunca deu bola para a música pop, indiferença que se estendia aos Beatles, mesmo no auge da fama dos Fab. Preferia Alban Berg, opção que absolutamente não dá para criticar. Mas o que queria destacar é que, no livro em que narra sua juventude meio existencialista e difícil em Londres, nos anos 60, Coetzee cita um episódio de sua adolescência (ainda na Cidade do Cabo) que me tocou bastante. Não me recordo com exatidão, acho que se tratava de sua admiração por um poeta ou romancista que vivia distante (ou de quem ouvia pelo rádio alguns poemas de vez em quando, preciso checar) e da necessidade que tinha de comunicar isso de alguma forma ao emissor, no intuito de incentivá-lo a não parar. Ele pensava alto dizendo algo como “mensagem captada, câmbio”, - na verdade era esse o seu desejo, o de fazer chegar ao escritor que ele, John Cotzee, tinha entendido tudo, e que era para ele, escritor, continuar a produzir seus belos achados. Gosto de pensar que os textos, ou algum texto que escrevo neste blog, tb pode ser ‘captado’ por qualquer pessoa que viva na Terra e entenda o português. Ou, ao menos, por uma ou duas, que, como fez uma dia Cotzee, podem pensar alto: “mensagem captada, siga adiante”. É o que almejo aqui, e sei que não é pouco.

O racional

Gostei do presidente do Corinthians dizer o velho e bom óbvio. A declaração já tem um tempinho até. Que, por mais que esteja se reforçando, o Corinthians não tem a obrigação de vencer esta Libertadores 2010. Ficou subentendido que a obrigação é disputá-la, chegar às finais e, se possível, ser campeão. Muito bem dito, porque nenhum time ou seleção, por maior ou melhor que seja, tem a obrigação, a priori, de ganhar um título. Nem o Brasil de Pelé e Garrincha tinha, nem o Santos de Pelé e Pepe tinha – mas venceram quase tudo, mas sem jamais prometer que venceriam, porque isso é para os que não têm fibra, confiança, e precisam falar, falar, falar e falar. O Corinthians ficou na longa fila do Paulista principalmente por achar que, a partir de um dado momento, tinha a obrigação de ganhá-lo. Então, além dos óbvios problemas causados por Pelé, Coutinho, Da Guia, e tantos outros, mesmo já com o grande Rivellino, não ganhou nada, claro. Eis a lição, que as antas de sempre teimam em assimilar, mas que bom que a voz sensata vem de quem dirige o clube. Mas PS: sinto que sim, vamos ser campeões da Libertadores deste ano, quem viver verá!! PS2: a seleção brasileira está entre as favoritas, mas não é a favorita, portanto não tem a obrigação de vencer a Copa da África do Sul. Acho uma tremenda cafonice isso de os brasileiros se acharem sempre os mais cotados, os superfavoritos no futebol, e o pior é que imprensa só faz ajudar nessa crença tão provinciana quanto burra, enganosa. Tanto que, em 2006, torci pela França de Zidane, descaradamente. Por Zidane, em nome do bom futebol e tb por causa dessa nossa jequice. PS3: mesmo que em nome do bom futebol, não torço ou torceria contra o Corinthians jamais!

Mistério

Aliás, o surgimento e sucesso dos Beatles e de outras bandas britânicas sempre me intrigou. Por mais que se afirme que Liverpool, pelo fato de ser um porto que recebeu muitos combatentes americanos durante a II Guerra, e que mesmo antes disso já era cosmopolita exatamente por ser uma cidade portuária, onde se ouvia e via de tudo, não entra fácil na minha cabeça que jovens ingleses (de Liverpool ou não) do final dos anos 1950 pudessem sequer cogitar fazer algo remotamente parecido com rock’n roll, uma música germinada nos Estados Unidos por seleção natural ao longo de décadas, séculos, tendo bebido na fonte do folk, jazz, country, blues, rhythm and blues, até resultar em Little Richards, Chuck Berry, Jerry Lee Lewis e Elvis. O fato de falarem a mesma língua não justifica, ou não deveria ser a explicação mais satisfatória. Talvez o fator Elvis, sendo ele branco, seja a chave, mas o fato é que os próprios Beatles - e isso existe até hoje entre músicos ingleses – se sentiam uns caipiras quando o assunto era os Estados Unidos da América. Qualquer coisa dos Estados Unidos, e quando no caso, era a música, então... Nem em sonho podiam sequer aspirar alguma comparação com estes monstros sagrados, que já eram mitos na época. Para mim seria como se portugueses, a partir do meio dos anos 60, senão no samba (mas talvez até nele), mergulhassem de cabeça na nossa bossa-nova, e que lograssem êxito! De qualquer forma, depois quero me aprofundar mais nesse assunto, porque o considero completamente ignorado. Nunca li nada sobre essa suposta contradição, ou pelo menos nada que me satisfizesse.

Destiny

Quando John Lennon estava para completar 21 anos, ganhou de presente de sua famosa tia Mimi um dinheirinho que deu para pagar uma viagem de fim de semana a Paris. A verba permitia até incluir um amigo, e ele chamou Paul – mas fizeram boa parte do percurso pedindo carona, para economizar e farrear. Engraçado que depois de famoso John quase sempre fizesse questão de mostrar suas origens proletárias. Na verdade, foi o único beatle de classe média, os outros sim, eram proletários (ou nem chegavam a tanto, como Ringo). O fato é que pôde cursar uma faculdade em Liverpool, no curso nada proletário ou técnico de Belas Artes. Essa viagem é típica de alguém que podia ter todos os motivos para ser rebelde – rejeitado que foi pelos pais, morte prematura da mãe, do tio querido etc – mas que pobre não era. Bom, mas era só para falar que houve um momento em Paris em que John e Paul, ainda dois desconhecidos, ‘complet unknown’, foram conhecer a torre Eiffel, coisa meio inevitável para qualquer turista que visita pela primeira vez a cidade. Gosto de imaginar a cena - começo de outubro de 1961, igual a tantas de todos os dias nesses últimos cento e tantos anos naquele mesmo cenário, senão pelo fato de que, pouco menos de um ano depois, estariam ambos começando um conto de fadas que os levaria ao topo do estrelato do show biz mundial, em qualquer tempo. Foram produto e ao mesmo tempo catalisadores de grandes e incríveis mudanças, mas naquele momento só estavam comemorando a maioridade de John, com um futuro incerto e pressões familiares para que tomassem outro rumo profissional. Mas já estava escrito.