domingo, 31 de outubro de 2010

A Day in the Life vs. Killing Moon

Em entrevista recente, Ian McCulloch disse a Paulo Ricardo, na Folha, que ‘Ocean Rain’ (1984) é melhor do que Sgt. Pepper's (1967), porque o disco da sua banda seria mais regular e não tem bobagens como “When I´m Sixty-Four”. Não achei absurdo, primeiro porque gosto muito desse disco do Eco & The Bunnymen, e segundo porque, para mim, o Pepper’s nem de longe é meu disco preferido dos Beatles, apesar de reconhecer sua importância histórica.
De fato, “Sixty-Four” é uma bobagem (e acho que nem é a única), mas o mais importante é constatar que praticamente nenhuma das grandes canções dos Beatles lançadas em 1967 (e foram muitas) faz parte do álbum - no mesmo 1967, o disco com a trilha do filme Magical Mystery Tour é melhor, http://pt.wikipedia.org/wiki/Magical_Mystery_Tour , mesmo sem ser "conceitual".

Mas há, claro, “A Day in the Life” - principalmente os primeiros dois minutos e quinze segundos, a parte composta e cantada por John Lennon (antes de Paul entrar com o vocal, no trecho de sua autoria ["Woke up, fell out of bed" ...]), que é um monumento.

Ainda sim, difícil discordar de Ian. Comparando os discos, o de sua banda soa mais consistente (mas obviamente não mais impactante), mas nenhuma canção, nem mesmo a inacreditável “Killing Moon”, consegue superar (ou igualar) esses 2’.15’’, uma obra-prima que talvez seja o ponto mais alto da música pop até hoje. O vocal de John, a melodia, a tensão quase insuportável do arranjo - a bateria de Ringo indo e vindo, a linha do baixo de Paul, os acordes dos pianos, enfim, e o fato não menos importante de a canção ter surgido ainda na década de sessenta. É a genialidade de John se manifestando, intransigente.

Para comparações:

http://www.youtube.com/watch?v=di7fKh3Vbj8
http://www.youtube.com/watch?v=3DRcah0SUfA

PS: interessante ver Ian empunhando um violão, numa das maiores canções do pop, ever.
PS2: curiosamente, a guitarra fica em segundo plano nestas duas obras-primas.

PS3: versão pré-finalizada estúdio de A Day In The Life:
http://www.youtube.com/watch?v=wklSXNPtiPA&feature=related

sábado, 30 de outubro de 2010

Grande Phil Collins!

"You'll Be in My Heart" (para o filme Tarzan, da Disney, 1999)
http://www.youtube.com/watch?v=9RiRFTLH0y8&feature=related

quarta-feira, 27 de outubro de 2010

Surpresa

Hoje ouvi no rádio “Pra não dizer que não falei das flores”, De Vandré, com ele. Para minha surpresa, fiquei tocado pela beleza da canção, que não ouvia há um bom tempo. Sua voz potente mas sem floreios, quase seca, soa bem; o arranjo com dois violões, muito bem tocados – solo e acompanhamento – dá um tom suave, que contrasta com a letra pregando a revolução. A própria letra é indiscutivelmente bonita, bem escrita - seu tom assumidamente planfletário/conclamatório, de tão eficiente, faz a gente ter vontade de pegar um cantil(!), um canivete suíço e sair por aí, atrás de alguma coluna Prestes perdida, hehe! Enfim, trata-se de uma bela canção, que não envelheceu tanto assim, ou melhor: envelheceu com classe.

PS: de qualquer forma, revolucionário hoje, no Brasil, é eleger Serra presidente. "vem vamos embora que esperar não é saber - quem sabe faz a hora não espera acontecer". O refrão segue atual!

Segue link http://www.youtube.com/watch?v=1KskJDDW93k 

PS 2: felizmente consegui o da gravação em estúdio (a que ouvi no rádio), e não a versão ao vivo, bem menos interessante musicalmente, mas que é o link mais comum da canção no youtube.

Haydn - trios para piano

Definitivamente, o melhor Mozart não teria existido sem os trios para piano (com cello e violino) de Haydn - não é à toa que Mozart idolatrava tanto seu conterrâneo mais velho. Confira o trio em Dó menor, que ouço agora a Rádio Cultura FM.
Pena, perdi o número do catálogo da obra e não consegui encontrar no YouTube, fica para uma próxima.

PS (ler post anterior)

Me ocorreu que "Bastidores", consagrada por Cauby Peixoto já em 1980, pode ser considerada o 'Drama' de Chico Buarque, evocando o passado com maestria, com toques de atualidade ("nunca cantei tão lindo assim"). Melodia e letra perfeitas - outra obra-prima do gênero retrô.

http://www.youtube.com/watch?v=WaqXdSUWKfg&feature=related
PS: pena que só consegui uma versão ao vivo, bem inferior a de estúdio, como é praxe.

Bastidores
Chico Buarque

Chorei, chorei
Até ficar com dó de mim
E me tranquei no camarim
Tomei o calmante, o excitante
E um bocado de gim

Amaldiçoei
O dia em que te conheci
Com muitos brilhos me vesti
Depois me pintei, me pintei
Me pintei, me pintei

Cantei, cantei
Como é cruel cantar assim
E num instante de ilusão
Te vi pelo salão
A caçoar de mim

Não me troquei
Voltei correndo ao nosso lar
Voltei pra me certificar
Que tu nunca mais vais voltar
Vais voltar, vais voltar

Cantei, cantei
Nem sei como eu cantava assim
Só sei que todo o cabaré
Me aplaudiu de pé
Quando cheguei ao fim

Mas não bisei
Voltei correndo ao nosso lar

Voltei pra me certificar
Que nunca mais vais voltar

Cantei, cantei
Jamais cantei tão lindo assim
E os homens lá pedindo bis
Bêbados e febris
A se rasgar por mim

Chorei, chorei
Até ficar com dó de mim

Drama (ler post Festa Imodesta)

Também de 1974, gravada estupendamente por Maria Bethânia, mostra os recursos infindáveis do compositor, evocando na melodia, sonoridade e letra, o melhor estilo "dor-de-cotovelo" produzido no Brasil nos anos 30 e 40, mas com um ou outro verso que nos fazem saber que não se trata de uma velha canção (como a último verso do refrão). Melodia riquíssima, que não se repete, apenas o refrão, grudento. Letra que esbanja virtuosismo na homenagem retrô, sem ironias tropicalistas. Vicente Celestino, que já tinha morrido na época, aprovaria, com louvor. Obra-prima!
http://www.youtube.com/watch?v=VRQni3vJWrE

Drama
Caetano Veloso

Eu minto mas minha voz não mente
Minha voz soa exatamente
De onde no corpo da alma de uma pessoa
Se produz a palavra eu

Dessa garganta, tudo se canta:
Quem me ama, quem me ama?

Adeus! Meu olho é todo teu
Meu gesto é no momento exato
Em que te mato

Minha pessoa existe
Estou sempre alegre ou triste
Somente as emoções

Drama!

E ao fim de cada ato

Limpo num pano de prato
As mãos sujas do sangue das canções

Saudosismo

Esta gravação, de 1968, com os Mutantes, sempre foi bem rara, mas agora o YouTube facilita tudo. É uma das grandes canções de Caetano, em minha opinião. Melodia simples, mas bem construída, letra que homenageia João Gilberto e a bossa nova, remetendo a uma época já precocemente distante, em que ainda vigorava a liberdade política e um bem estar difuso. Traz uma sutil e bela referência aos novos tempos da ditadura militar ("eu você, depois, quarta-feira de cinzas no país"), ao mesmo tempo em que critica a banalização da Bossa ("as notas dissonantes se integraram ao som dos imbecis"). Por tudo isso, não deixa de ser uma canção de protesto, mas sem os ranços típicos do gênero. Acima de tudo, é uma belíssima canção da saudade do que passou e não tem volta, mas também de superação - temos que seguir adiante e virar a página, a despeito de tudo. O refrão "chega de saudade" no imperativo, sintetiza essa idéia, subvertendo a letra da obra-prima de Tom e Vinicius, cuja levada tem mais a ver com "não agüento mais de tanta saudade", uma rendição.

http://www.youtube.com/watch?v=wlpdPO1DGJ0

Festa Imodesta

De 1974, mostra que, se quisesse, Caetano produziria em quantidade industrial sambas da velha guarda, de primeira linha, a Chico Buarque, para quem a composição foi especialmente composta. A melodia é rica e complexa, e o compositor parece se divertir em usar alguns clichês do gênero, enriquecendo-os. Mas penso que há uma pegadinha ali - a letra metalingüística, de rimas ricas, que foge dos temas de sempre do samba, do samba-canção, e debocha da censura da época, parece ser também quase uma ironia ao próprio gênero e seus criadores. Grande canção de Caetano Veloso, aqui com ele e Teresa Cristina.

http://www.youtube.com/results?search_query=festa+imodesta+teresa+cristina&aq=f

Meias verdades e mentiras inteiras

Sempre que a claque petista invoca a coragem de Dilma durante a ditadura militar, eu penso que a coragem será ou não uma virtude, a depender do contexto em que é empregada. Hitler, Pinochet, Stálin, Franco, Mao, Mussolini, Sadam e tantos outros podem ter sido tudo de ruim - e foram - mas ninguém lhes pode negar a coragem que sempre tiveram. Mas em prol de quê?

Digo isso porque, ainda que Dilma tenha de fato combatido a ditadura militar, é mentira que a coragem da candidata oficial teria servido para defender a democracia brasileira àquela época. Nada justifica a violência, a tortura que barbara e covardemente ela sofreu pelas mãos de militares criminosos, mas sua luta, ao contrário do que a candidata afirma na campanha, não era para trazer de volta a democracia perdida, e sim para tentar implementar um socialismo à cubana no país - um regime totalitário, enfim, pior que a ditadura militar, que tinha natureza autoritária, com exceção do período Médici. É bem diferente da atuação de um Charles de Gaulle, que lutou pela resistência francesa contra a ocupação nazista, tornou-se seu líder maior, se arriscou por ela, mas sempre em defesa da democracia, tanto assim que, quando a guerra acabou, de Gaulle tornou-se primeiro-ministro do Governo Provisório Francês, mas renunciou logo depois, devido a conflitos políticos. Ele só voltou a chefiar o governo mais de uma década depois, como primeiro-ministro, escolhido pela Assembléia Francesa, e em seguida tornou-se, pelo voto, o primeiro presidente da Quinta República.

Nada a ver com 'comandantes' como Fidel, Pol Pot e tantos outros que, ao liderar um processo revolucionário bem-sucedido, se sentiam no direito de se instalar com seu grupo no poder, sem consulta popular, para lá permanecer indefinidamente, formando um estado totalitário, o que seria o caso se a organização de guerrilha VAR-Palmares (Vanguarda Armada Revolucionária Palmares), a que Dilma pertenceu, triunfasse no Brasil - o que, de qualquer forma, sempre foi uma possibilidade muito remota. A tentativa recorrente de reescrever o passado é inaceitável, mas o pior é que, infelizmente, tem sido bem-sucedida na democracia brasileira, que assim, pouco a pouco, vai sendo minada.

Falta verve

No pouco tempo que agüento ver a Dilma falar na TV - aquela fala truncada, nervosa e sem nexo de quem tentou decorar as frases, mas sem efeito - sempre me vem à cabeça a falta que faz a verve de um Brizola ou de um Covas. Num debate com um político desse naipe, Dilma seria trucidada, e sua candidatura, rapidamente liquidada, pelo ridículo em que cairia.

quinta-feira, 21 de outubro de 2010

Dramin é preciso

Sei lá por que, hoje tive estômago para ver inteiro o programa da Dilma Rousseff na TV. Como diria o outro, naquele velho (e cafona) samba-canção, qual o quê! O clip mostrando o apoio incondicional dos velhos artistas famosos de sempre à candidata do PT, foi uma das coisas mais bizarras e deprimentes que vi em muito tempo. De um oficialismo triunfante que nem nos piores tempos de Stálin deve ter sido visto na classe artística. Mas ali ninguém fazia nada a contragosto, e muito menos havia algum tipo de medo ou constrangimento. O clima festivo era só uma defesa escancarada pela continuidade das mamatas do dinheiro fácil e sem limites das estatais. Tudo pela arte, mas com dinheiro público! Nojo em estado bruto. Pensando bem, não tenho estômago pra isso, não.

quarta-feira, 13 de outubro de 2010

Tudo é política nas eleições - ainda bem!

Boa parte da imprensa ataca a questão do aborto como se ela fosse uma questão reles e irrelevante para os brasileiros. Enfim, uma jequice a mais, uma baboseira religiosa sem maior importância. Mas não é, pelo fato de que a maioria esmagadora, gosta-se ou não, é contra. Portanto, trata-se de uma discussão política, sim. É uma atitude esnobe e antidemocrática pautar o que pode e ou que não pode entrar numa campanha. Quem decide? Os colunistas "isentos" da Folha, do portal Terra, do IG? O fato concreto é que Dilma sempre apoiou a descriminação do aborto, em consonância com a agenda de seu partido. Aliás, a questão foi abertamente colocada no PNDH (Plano Nacional de Direitos Humanos) 3, sob sua batuta, na Casa Civil. Tem todo o direito de fazê-lo, o que não pode é dizer agora – reta final da campanha - que sempre foi contra, porque é uma mentira que atenta contra a inteligência das pessoas. Em política, assim como no cotidiano da vida privada, ninguém é obrigado a ser 100% sincero - mas não dá para sair mentindo deliberadamente e achar que ninguém vai perceber. Até porque, está tudo documentado. Se a imprensa brasileira fosse menos servil – como acontece nos Estados Unidos e Inglaterra – toda vez que o assunto fosse citado em algum jornal ou TV, não hesitariam em mencionar que, em 2007, num debate na Folha de S. Paulo, Dilma deu a tal declaração (que foi gravada em vídeo) etc etc. Mas aqui, em nome da falsa isenção, quase todos os veículos (com exceção da Veja), fazendo a vontade da candidata oficial, insistem no pretérito “teria dito”, insistem na palavra “boato” - é deprimente. Aliás, é incrível que ainda não se tenha feito esta simples pergunta a ela: “candidata, você mudou de idéia quando?, já que, em 2007, a senhora declarou etc etc”. Simples assim. Mas não se faz a pergunta, e exatamente por isso o assunto perdura, o que é legítimo num pleito democrático. Não é “culpa” do eleitorado, que tem o direito à informação para decidir seu voto.

PS: em 1985, nas eleições para a prefeitura de São Paulo, Fernando Henrique Cardoso, no último debate da TV, teve de responder a Boris Casoy se acreditava ou não em Deus. FHC tergiversou, não disse nem que sim nem que não, e perdeu a eleição para Janio Quadros por margem menor que 0,5%. Hoje Dilma poderia ter feito um papel melhor: bastava não renegar o que falou sobre o aborto, afirmando, por exemplo - caso essa questão fosse tão decisiva assim, e parece que não é o caso - que repensou e mudou de idéia. Mesmo que não estivesse sendo sincera, seria uma atitude legítima para um candidato - assim como foi legítimo FHC não ter respondido "não, não acredito em Deus". Ilegítimo e imoral teria sido FHC se dizer um devoto desde sempre (e olha que ele não tinha declarado o contrário publicamente), e é assim que Dilma vem agindo, ao mentir sobre o que disse sobe o aborto e se declarar "devota" de Nossa Senhora desde criancinha...
É que é prática comum no PT a tentação de reinventar a história, omitindo ou aumentando esse ou aquele acontecimento, conforme a melhor conveniência da ocasião. Mas na era digital, onde quase tudo é registrado e arquivado, a tarefa fica cada vez mais difícil, e desta vez esse discurso parece que está caindo no vazio. Já não era sem tempo.

sexta-feira, 8 de outubro de 2010

Llosa e a velha patrulha

Mario Vargas Llosa levou o Nobel, mas a intelligentsia pucusp-unicampiana não poderia saudá-lo assim, sem mais nem menos, afinal o grande escritor há muito abandonou a esquerda como alternativa para o desenvolvimento. Na Folha Ilustrada de hoje, um texto de Laura Janina Hosiasson, professora de literatura hispano-americana na FFLCH da USP, reconhece os méritos estéticos de Llosa, mas faz questão de ressalvar sua mudança ideológica. Até aí tudo bem. O problema é escrever mentiras para justificar sua tese. Laura diz, por exemplo, que Llosa era o candidato conservador nas eleições presidenciais de 1990, contra Alberto Fujimori. Ou seja, para ela, progressista era Fujimori, certo? E provavelmente porque Llosa fez uma campanha em que defendia as bandeiras da economia de mercado e do Estado democrático. Mui conservador, né?! Em outro trecho, a professora acusa o Llosa articulista e intelectual de ter “endireitado”, o que não teria nada demais em si, se sua explicação para o fenômeno não fosse a seguinte pérola da análise política: Llosa teria guinado para a direita porque passou a “amenizar, contemporizar, aparar arestas”. Isso lá é definição da atuação da direita, qualquer direita? E é tudo o que o escritor não vem fazendo. Pelo contrário. Sem jamais se deixar intimidar, em textos sempre brilhantes, publicados nos principais jornais do mundo, ele compra brigas com quem ainda defende estados totalitários, de esquerda ou de direita, mas certamente aí reside o problema - defender o lado errado, ou atacar o certo. Se Llosa ao menos defendesse o regime cubano, Laura possivelmente não lhe pegaria tanto no pé...  Mas a professora faz ainda pior. Estabelece um paralelo arbitrário, em que a literatura de Llosa decai em valor artístico na medida em que o autor vai guinando da esquerda para a direita. Está tudo no trecho " (...) penso que a fórmula que o grande escritor peruano encontrou para costurar sua vocação literária com a do político está na raiz de uma retração na qualidade da escrita"  Mesmo que a coincidência fosse verdadeira - e penso que não é - seria absurdo considerar que fosse um caminho deliberado. Argh.

quinta-feira, 7 de outubro de 2010

Blog

Descobri um excelente, Flanela Paulistana (by Leticia). http://flanelapaulistana.com/

Impecável e preciso editorial da Folha de S. Paulo de ontem

"Opinião flexível"
http://sergyovitro.blogspot.com/2010/10/editorial-folha-de-sao-paulo_6117.html

Marina na hora da verdade

Se Marina fosse um personagem político de fato notável, o que não acredito ser, abraçaria sem delongas a candidatura de José Serra, por tudo que o tucano vem fazendo - em conjunto com o Partido Verde - na questão ambiental em São Paulo nos últimos cinco anos, desde o tempo de prefeito da capital. Ao mesmo tempo, a opção por Serra seria sua declaração de independência definitiva em relação ao seu ex-partido, que ainda pensa que pode manter a senadora sob controle, como é típico de organizações antidemocráticas. Declarar sua neutralidade no segundo turno, como está parecendo que vai acontecer, é uma atitude hipócrita - mais honesto e legítimo pregar o voto nulo.

quarta-feira, 6 de outubro de 2010

Série

O piloto da nova série da HBO, Boardwalk, custou 20 milhões de dólares e foi dirigido por Scorsese. Foi escrito por Terence Winter, um dos principais roteiristas da Família Soprano, o que é bem mais que uma credencial, já que a série era soberba. Steve Buscemi faz um gangster da época da Lei Seca americana, nos anos 20, que é baseado num personagem real. Quem viu diz que vai marcar época, tanto quanto os Sopranos. Não duvido. A ver.

Nova TV Cultura

A TV Cultura mudou sua programação, e mudou para melhor, não há má vontade no mundo que impeça alguém de reconhecer o avanço. Muita coisa boa, mas destaco o novo Metrópolis, que deixou de ser aquele oba-oba habitual da cena artística paulistana, com cara de assessoria de imprensa, aumentou de tamanho e virou um programa analítico, com um apresentador que entende do riscado. O jornalismo também saiu do marasmo, e há bons enlatados da BBC sobre ciência, além dos filmes (recentes) da Mostra, duas vezes por semana. O programa Login foi mantido e é bem acima da média - não duvido que a jovem dupla de apresentadores - fluentes e talentosos - já esteja sendo assediada pela concorrência.

Se...

Na microbiografia de Rimbaud escrita por Edmund White, ficamos sabendo que o poeta - aos 20 anos e já com sua obra literária terminada - tentando combinar seu gosto por viagens com a necessidade de se sustentar, se ofereceu como tutor para famílias ricas em alguns países da Europa. Era 1874. Não conseguiu nada e acabou viajando por conta própria para a África oriental e Iémen, lugares bem inóspitos na época e onde, como era previsível, não teve vida fácil. Me ocorreu que ele poderia ter pensado no Brasil - haveria de conseguir alguma coisa no Rio da corte de Dom Pedro II. Talvez se animasse a continuar na poesia. É uma hipótese.

Caetano de volta ao batente

Leio no Estado que Gal Costa gravará um disco com inéditas de Caetano. O compositor já teria seis canções prontas, e ainda vai escrever mais algumas. Essa notícia alegrou meu dia - Caetano voltando a compor a todo vapor. Já foi dito neste espaço que esta parceria é um dos grandes acertos da MPB. Só espero que a inspiração de Caetano esteja num registro diferente daquela presente no álbum "Cê".

terça-feira, 5 de outubro de 2010

Incongruentes

O premiado escritor argentino Alan Pauls, em entrevista ao Estadão de hoje, ainda que de forma meio dissimulada, se recusa a criticar a tentativa explícita dos Kirchner de estrangular os recursos econômicos dos principais jornais de seu país, atitude que atenta contra a liberdade de expressão e a democracia na Argentina. Pelo contrário, diz que esse embate é saudável por incentivar um "debate vital" a cerca do poder - ao seu ver excessivo - de "certos grupos mediáticos". Ao se manifestar dessa forma, faz (má) companhia ao cantor Fito Paez, que foi pelo mesmo caminho, desta vez em recente declaração à Folha de S. Paulo. Parece que esses artistas sentem algum tipo de nostalgia inconsciente da ditadura. Lamentável. Deprimente.

Aves ou ovos?

Incrível a má vontade da imprensa em geral com José Serra. Ele só teria chegado ao segundo turno por obra de Marina Silva. Tudo bem. Mas seus mais de 33 milhões de votos ajudaram um pouquinho, não? É como se fosse Serra, e não Dilma, o candidato a contar com a máquina do oficialismo. É uma postura que, entre outros defeitos, falta com a verdade, matéria-prima número um do jornalismo, ou do que deveria ser o jornalismo. Argh.

Eleições: os números sem maquiagem

Na reta final das campanhas, os institutos de pesquisas costumam divulgar apenas o percentual de votos válidos dos candidatos mais bem colocados. A razão disso é a possibilidade de um deles atingir a metade mais um dos votos válidos, e dessa forma eliminar o segundo turno. Ok, é uma opção que tenta simplificar o processo, mas considero isso um equívoco, porque infla a votação dos postulantes, mostrando números que não espelham a realidade. Vejamos alguns números desta eleição para presidente da República, realizada anteontem.


O (excelente) site do TSE http://www.tse.gov.br/internet/index.html informa que no Brasil há 135 milhões e 804 mil eleitores, e que nestas eleições a abstenção foi de 18,12%, ou seja, compareceram às urnas 111 milhões e 193 mil eleitores. Mas desse total, 8,64% votaram nulo ou branco (votos inválidos), portanto os votos válidos totalizaram 74,80% sobre aqueles 135 milhões, o que corresponde a 101 milhões e 590 mil votos - para vencer no primeiro turno, bastaria obter 37,40% mais um voto. Vamos agora aos percentuais de votos válidos de Dilma, Serra e Marina, números que foram amplamente divulgados na imprensa: respectivamente, 46,91% (47 milhões e 651 mil votos para Dilma), 32,61% (33 milhões e 132 mil votos para Serra) e 19,33% (19 milhões e 636 mil votos para Marina).


Ocorre que, se formos computar os votos de cada um sobre o total de eleitores (quase 136 milhões, sem entrar na abstenção) esses percentuais evidentemente caem muito, mas trazem uma radiografia mais realista do quadro eleitoral em relação à população brasileira. Cesar Maia prefere calcular com base na quantidade total de votos (válidos e não válidos), já descontando a abstenção, mas mesmo assim estes percentuais serão menores do que apenas os do universo dos válidos. Vamos aos resultados nos dois cálculos: sobre o total de eleitores (sem abstenção), o percentual de Dilma cai para 35,08%, o de Serra para 24,39% e o de Marina para 14,45%. Quando excluímos os que não compareceram (Cesar Maia), Dilma passa a ter 42,85%, Serra 29,79% e Marina 17,65%. São os números reais. Ou seja: se a tendência de abstenção e nulos se mantiver (e deve aumentar, porque haverá feriado prolongado no fim de semana do segundo turno), o candidato que conseguir algo entre 36 e 37% do total do eleitorado (pouco mais de um terço dele) será o próximo presidente do Brasil. Simples assim.