Já escrevi em outro post que considero o falsificador holandês Han van Meegeren um quase gênio,* porque as principais criações (sem aspas) dele não foram simplesmente reproduções de quadros famosos dos grandes mestres – ele também as fez, com perfeição – mas quadros que podem nunca ter existido, ou se existiram, não sobreviveram.
Meegeren criou um célebre quadro desaparecido (ou inexistente) de Vermeer, que se enquadra nesta categoria - só havia descrições vagas sobre a obra. Pois ele encarou o imenso desafio técnico/estético da empreitada e se lançou na feitura da tela, que, de tão belo e verossímil, passou a fazer parte da história da arte.
No mesmo post, lembro de ter enfatizado que, por outro lado, fazer o mesmo com os grandes gênios da música seria tarefa ainda mais difícil. Talvez pelo fato da música ser uma forma de arte menos palpável, talvez a mais impalpável de todas.
Aconteceu que na última segunda-feira tive a sorte de acompanhar pelo celular o programa ‘Encontro com o Maestro’ (infelizmente apenas a parte final), com João Maurício Galindo, que abordava justamente alguns casos famosos de boas e más falsificações de compositores importantes (e de alguns nem tanto). É o caso, por exemplo, do austríaco Fritz Kreisler (1875-1962), célebre virtuose do violino, que se lançou em falsificações (supostas “partituras perdidas”) que incluíam Vivaldi e Couperin, as quais foram muito bem recebidas e dadas como autênticas, até que ele mesmo “confessasse” a traquinagem ao The New York Times, em 1935, contando que as composições eram de sua lavra. Incrível.
O programa contou também o caso do músico francês (pena que não tive tempo de anotar) que alegou ter “descoberto” uma obra de Mozart – por incrível que pareça, ela foi aceita pelos especialistas e passou a figurar no catálogo Köchel, até o "descobridor" ser desmascarado pelo grande musicólogo Alfred Einstein, que pediu para dar uma espiadinha na partitura! Sensacional! Galindo tocou esta falsificação no programa, e apesar de muito verossímil, definitivamente não seria uma obra-prima do grande compositor austríaco.
Aí é que está. Como questionei naquele post, como criar uma cantata “perdida” de Bach (e sabemos que um terço delas de fato se perdeu), que pudesse estar à altura de uma cantata de Bach? Neste caso, seria uma façanha quase impossível, porque o falsificador-criador, diferente do caso da pintura, partiria praticamente do zero - o fato de conhecer de cor o estilo do gênio a ser imitado não cria muito valor. Talvez um Mozart ou um Beethoven conseguiriam, tivessem tido tempo para uma brincadeira interessante com essa. Será que Schoenberg, Prokofiev, Stravinsky ou Shostakovich dariam conta?
Enfim, se pudesse, passaria dias e dias escrevendo sobre o assunto, que se desdobra em muitos – cogito tentar entrevistar Galindo a respeito. Hoje fico por aqui.
* "Quase gênio" fica por conta da falta de originalidade, pois só o autor verdadeiro pode reivindicá-la.
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